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Uso do reconhecimento facial nas Igrejas

Interessante reportagem de Ethel Rudnitzki, publicada no site da Exame em 14/11/2019, relata que as instituições religiosas cada vez mais fecham negócios com empresas que atuam com monitoramento e reconhecimento facial.



Duas empresas mereceram destaque na última 15ª ExpoCristã que é o maior evento voltado para o público cristão da América Latina: a empresa estrangeira de inteligência artificial Kuzzma e a empresa brasileira Igreja Mobile.


O site da Kuzzma informa que o reconhecimento facial funciona a partir de uma câmera panorâmica de alta resolução instalada nas igrejas, capaz de identificar informações pessoais e assiduidade dos fiéis nos cultos. A partir disso seriam gerados relatórios para cada pessoa, incluindo estatísticas sobre seu comportamento e até avisando em casos de atividade considerada anormal.


O CEO da Kuzzma diz o seguinte sobre a qualidade dos dados (comportamentais) que são tratados: “Dados como sexo, idade, frequência, horário de chegada, motivos prováveis de atraso e muitos outros são analisados e apresentados em relatórios. Conseguimos definir em nossas métricas até mesmo se alguém precisa de uma visita pastoral”.


A Igreja Mobile, por sua vez, utiliza software da TecVoz, empresa de segurança eletrônica, mas com especificidades voltadas para as necessidades das igrejas. "Nós conseguimos definir para o cliente a assiduidade do usuário, contagem de pessoas, humor do usuário, se ele está feliz, se está triste, se está angustiado, com medo. Nós conseguimos definir isso tudo”, dizo diretor de desenvolvimento, Luís Henrique Sabatine.


Não há dúvidas sobre o caráter sensível dos dados tratados. A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei Federal 13.709/18) definde como sensível todo dado pessoal sobre origem racial ou étnica, convicção religiosa, opinião política, filiação a sindicato ou a organização de caráter religioso, filosófico ou político, dado referente à saúde ou à vida sexual, dado genético ou biométrico, quando vinculado a uma pessoa natural.


O tratamento de dados pessoais sensíveis somente poderá ocorrer quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, para finalidades específicas, que no presente caso poderia ser o aprimoramento da relação entre a igreja e os seus fiéis.

Existem hipóteses de tratamento de dados pessoais sensíveis sem a necessidade de consentimento do usuário, mas nenhuma aplicável ao caso: prevenção à vida, tutela da saúde, prevenção de fraudes, dentre outras elencadas no art. 11 da Lei 13.709/2018.

Além disso, ainda que as igrejas obtenham o consentimento do fiel, há controvérsia sobre a legalidade do consentimento, visto que ele deve sempre ser livre, ou seja, se o usuário quiser negar o consentimento, ainda assim poderá frequentar a igreja e não poderá ter seus dados faciais tratados (coletados), e ainda deverá estar livre de qualquer tipo de coação hierárquica.


Ou seja, há uma série de dúvidas sobre se este tipo de conduta por parte de algumas igrejas está dentro dos limites legais, visto que estamos diante de tratamento de dados pessoais sensíveis e o consentimento pode não ser a base adequada, visto que nesta relação o consentimento pode, por si, não ser considerado livre.


Cada vez mais a tecnologia de reconhecimento facial será utilizada. É um caminho sem volta esta facilitação, fruto dos avanços tecnológicos, porém, 2020 será o ano em que a LGPD entrará em vigência trazendo uma sistemática nova, em que o titular dos dados deve ser efetivamente titular de seus dados e não ficar totalmente à mercê de coleta de dados e tratamentos indiscriminados e ilegais.


As igrejas poderão instalar sistema de reconhecimento facial desde que adequadas aos termos legais, sob pena de sofrerem pesadas sanções, tanto de ordem financeira, como no aspecto reputacional. Como pairam dúvidas acerca da legalidade do uso do consentimento como base legal, talvez uma saída possa ser o uso do legítimo interesse como base, o que certamente envolverá a elaboração de relatório de impacto a ser analisado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados.


Este é um assunto que provavelmente ainda ressurgirá em outros modelos de negócio, como os das academias de ginástica, por exemplo, que já utilizam sistema de reconhecimento facial em suas dependências, para permitir a entrada do usuário. Em outro exemplo, temos lojas de varejo (Hering) que estão a utilizar do reconhecimento facial para criar uma nova experiência de interação com o cliente, permitindo o direcionamento de publicidade com ainda mais exatidão, pois pelas expressões faciais é possível detectar o que o usuário sentiu quando esteve diante de determinada peça de roupa, como uma calça ou uma blusa.


O assunto disperta visões antagônicas, visto que em algumas localidades, o reconhecimento facial não foi aceito e pode ser banido, como vem sendo discutido em Portland. E no Brasil, como será recebida esta possibilidade de vigilância capaz de detectar o seu humor?

 
 
 

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